Esse post ficou grandão, mas eu espero que vocês leiam, ainda mais se vocês não foram a nenhum manifesto, seja por medo, preguiça, ou por que na sua cidade não esta tendo nenhum. 🙂
O Brasil esta uma loucura. Uma loucura linda, devo dizer (como a que se passa na cabeça do V, de V de Vingança… Ah… :heart: ); e a cada dia protestos estão acontecendo no país, seja em capitais ou em cidades pequenas como a minha. E eu precisava dar a cara a tapa, né?
Eu moro em Ilhabela, litoral norte de SP; é uma cidade pequena e tranquila, o maior barato daqui são as praias (pra quem gosta né, por que eu… blerg!). Eu já falei sobre a taxa de transporte público e em como eu acho um absurdo cobrarem 2,90 (que ANTES DOS MANIFESTOS ~esmolaram~ pra gente 10 centavos, e agora é 2,80), sendo que em SP Capital cobram 3 reais, e se tem 854820584583483fi49it29ir0249i pessoas a mais e os ônibus fazem viagens de 5924850942r024ir0492 km a mais, nesse post aqui.
Dia 20 de julho, nós tivemos nosso manifesto.
As coisas começaram dias antes, com a organização e tal. O Kim, o Victor e o Henrique que ajeitaram tudo. Quando vi o evento do manifesto no facebook, não tive dúvidas, eu ia. Ajudei a fazer os panfletos, imprimi alguns e sai na rua distribuindo a torto e a direito, eu precisava fazer alguma coisa; tirar a raiva dessa porcaria de empresa de ônibus de alguma maneira.
A data do manifesto chegou e eu combinei com meu namorado de irmos juntos. E fomos. Mochila nas costas com celular, casacos, água e tinta. As horas vão passando e a gente vai ficando ansioso, “será que vai muita gente?”, “e se der problema com a policia?”, a gente fica com medo da violência, mesmo sabendo que ela foi a minoria da minoria e também que nessa cidade que se acontece um A todo mundo já fica ciente.
Quando a gente sai de casa e vai a caminho do lugar marcado pra concentração, vai vendo gente com a cara pintada, camisetas com mensagens e cartazes enrolados na mão; depois de um tempo já da pra ouvir os gritos, as palmas e os tambores… A gente ve a multidão, o núcleo dela, vários cartazes, vai tentando ler as mensagens…
Entramos no meio do povo e chegamos meio acanhados, a gente ainda não se sentiu parte daquilo, mas vai indo aos poucos. Gritamos de um jeito meio abafado, e entre risinhos envergonhados, enquanto a massa grita por melhorias com o fundo da garganta. Minhas palmas são fora de ritmo das dos demais, e quando o povo começa a andar a caminho do escritório da empresa de ônibus aqui, eu os sigo.
Ainda não me encaixei, mas to começando, vou vendo quanta gente tem na minha frente, e quantas tem atrás, e vou ficando maluca “sério, tanta gente assim?!”, vou encontrando amigos, lendo seus cartazes e gritando ao lado deles. Agora to fazendo parte.
A gente se anima com as musiquinhas, “quem não pula quer tarifa!”, com o povo pulando, a gente chama a galera pra rua “você ai parado, também é explorado!”, e não para de caminhar.
Do nada um BUM, uma fumaça ao longe. Eu paro por um instante, “gás lacrimogêneo?”, e internamente fico meio desesperada por dentro por uns 3 segundos. Eu sinto uma ardência na garganta, mas é tudo coisa da minha cabeça. “Calma, ta tudo bem? Foi só algum idiota com bombinhas”, meu namorado me acalma; fica tudo bem.
A caminhada continua, estamos quase chegando; os idiotas com bombinhas não param, e o povo entoa “Sem violência! Sem violência!”, com o tempo elas vão diminuindo.
Chegamos à frente do escritório, eu vejo câmeras e luzes fortes. Imprensa? É. O Kim discursa, gritamos pedindo muito além da tarifa zero, não ao porto de são sebastião, mais saúde, mais educação, mais apoio a cultura local! E chega dessa empresa de transporte ridícula que rouba nosso tempo e dinheiro!
Depois de um tempo ali, andamos outra vez; dessa vez vamos à balsa. A única entrada e saída da ilha. E decidimos: vamos parar a balsa. Ninguém entra, ninguém sai. Nos sentamos “daqui eu não saio, daqui ninguém me tira”.
Os organizadores discursam outra vez, e depois… Eu vejo meu pai pegando o megafone! Lembrei de todas as vezes que ele me contou da época dos caras pintadas, do impeachment collor, em que ele falou pra não sei quantas mil pessoas em cima de um carro de som. Lembrei do que representa tudo isso que acontece no Brasil, muito mais do que mais páginas no livro de história.
Lá no fundo a gente vê a balsa chegando, ela chega perto e da meia volta; ela não vai deixar seus passageiros na ilha, não agora.
Eu sinto que estou cansada, pés e costas moídos, e garganta também. Água, cade minha água? Bebo e dou também para meus amigos que querem. E os gritos e tambores não param!
O Henrique chama o pessoal, pede atenção, e da um aviso: há uns 500 manifestantes do outro lado da balsa que querem vir e dar mais forças ao manifesto, e além disso, uma ambulância que precisa vir, 2 pessoas em estado grave. “Deixamos passar?”, “Sim!” diz o povo. E a massa recua um pouco pra esperar a balsa e dar passagem pra quem vai chegar… Mesmo assim, na segunda vez que a balsa vem, ela não atraca, e quando eu fui embora, não vi chegarem nem manifestantes, nem ambulância.
Com o tempo o pessoal vai começando a ir embora, vou ficar só um pouco mais. O megafone vai passando e mão em mão, e quem quis, falou um monte. Vi até amigos meus subirem nos banquinhos pra falar, reclamarem que esses dias não tinha médico no hospital do Sul, que até hoje o Museu Nautico de Ilhabela não recebeu auxilio nenhum da prefeitura, e um amigo meu, Lucena, contando que caiu de skate e sofreu traumatismo craniano, e mesmo quando seus amigos ligaram pra ambulância, ela não vinha, pensando que era trote, e que se não fosse a insistência deles, ele poderia não estar vivo hoje. E as reclamações foram além de coisas só do município; o Victor pegou o megafone e contou como se sentiu ofendido pelo Marco Feliciano, presidente da comissão de direitos humanos, com o absurdo da “Cura gay”, e mandamos um belo “Filho da puta, vai se fuder! Filho da puta!” pro Marquinho, rs.
Depois de tudo isso, euzinha, cansada, acabada, rouca, suada, com os pés inchados, descabelada, com tinta na cara e morrendo de fome e sede, porem com a alma muito limpa, fui pra casa, feliz, e morrendo de orgulho.